APRESENTAÇÃO
O Departamento de Defesa e Segurança (Deseg) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) apresenta a edição de 2025 do Anuário de Mercados Ilícitos Transnacionais em São Paulo¹, que consolida dados de 2024 e dá seguimento à série histórica iniciada em 2016. Produzido pelo Observatório de Mercados Ilícitos, o Anuário se firmou como uma referência técnica sobre a evolução e o impacto da atividade criminal no setor produtivo paulista em nove setores industriais.
Em edições anteriores, as informações do Anuário subsidiaram ações estruturantes, como o Acordo de Cooperação na Área de Segurança entre a FIESP e o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), juntamente com a participação da FIESP na Task Force on Countering Illicit Trade (TF-CIT) da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), um órgão técnico que reúne empresas, governos, universidades e agências de enforcement de diversos países para analisar, discutir e propor medidas e políticas de controle.
Nesse sentido, para continuar a subsidiar as análises em mais frentes e mensurar o fenômeno criminal-econômico no contexto de São Paulo, o Anuário é composto, desde 2016, por duas pesquisas:
1. A Pesquisa de Monitoramento da Evolução dos Mercados Ilícitos, sobre nove setores;
2. A Pesquisa de Vitimização das Indústrias (PVI) do estado.
Essas pesquisas demonstram, entre outros aspectos, que os mercados ilícitos representam uma transferência ilegal de recursos e a ocupação de parte do mercado legal por operadores ilegais. Além disso, evidenciam a associação com a violência criminal, os danos à saúde e ao meio ambiente, e a perda de postos de trabalho e de arrecadação de impostos.
Nesta edição, a Pesquisa de Monitoramento da Evolução dos Mercados Ilícitos revela um cenário preocupante: os mercados ilícitos que afetam os nove setores monitorados movimentaram R$22,45 bilhões na economia paulista em 2024. Este valor, que representa uma perda direta para o setor produtivo, impediu a geração de mais de 155 mil empregos formais por mês e subtraiu quase R$10 bilhões em arrecadação de impostos federais e estaduais.
Os impactos são sentidos diretamente pelas empresas. A Pesquisa de Vitimização da Indústria (PVI) de 2025, cujos resultados são tratados no Capítulo 3, aponta que 40% das indústrias paulistas foram vítimas diretas de crime no último ano. A pesquisa também confirma a perigosa evolução dos crimes digitais, como estelionatos e o “contrabando digital” em plataformas de e-commerce, que emergiram como a principal modalidade de vitimização.
Nesse contexto, o Anuário reafirma seu objetivo de fornecer subsídios técnicos para a agenda de proteção da indústria e para o debate público. As análises apresentadas estão alinhadas aos estudos de órgãos-chave, como o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) e o monitoramento da Força-Tarefa da OCDE. Também são relevantes os estudos do Fundo Monetário Internacional (FMI), que evidenciam o impacto do crime no PIB dos países da América Latina², bem como as atualizações do Organized Crime Index (2023 e 2025)³ da Global Initiative Against Transnational Organized Crime (GITOC), a versão mais recente do Illicit Trade Report 2023⁴ da World Customs Organization (WCO) e o 2025 Illicit Trade Index, lançado recentemente pela Transnational Alliance to Combat Illicit Trade (TRACIT)⁵. Todos esses órgãos buscam fundamentar a formulação de políticas públicas e ações privadas que elevem o custo e o risco da atividade criminal.
Por meio do Observatório, de seus Grupos de Trabalho Temáticos e do Anuário de Mercados Ilícitos, o DESEG reafirma seu compromisso com esse esforço.
INTRODUÇÃO
Desde 2016, o Anuário de Mercados Ilícitos da FIESP realiza um mapeamento detalhado de nove setores industriais para quantificar e analisar o impacto da economia do crime em São Paulo.
A abordagem metodológica adotada é intencionalmente conservadora e focada na inclusão de produtos e estimativas do tamanho real do mercado ilícito. Para isso, são utilizadas apenas fontes de apreensões públicas e estimativas de subnotificações, a fim de garantir dados mais consistentes. A análise estritamente contábil quantifica o impacto econômico dos mercados ilícitos, levando em conta tanto a demanda lícita – baseada em dados oficiais de produção declarados por associações industriais e pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – quanto a demanda ilícita, derivada de valores estimados de roubos, furtos, contrabando, descaminho, contrafação e pirataria. Essa estratégia assegura a consistência e a comparabilidade dos dados ao longo do tempo, viabilizando uma análise mais robusta da evolução do fenômeno.
Embora focado em São Paulo, o estudo reconhece a natureza transnacional do fenômeno, cujas cadeias logísticas e financeiras ultrapassam fronteiras e afetam diretamente a indústria e o comércio. O enfrentamento a esses mercados exige estratégias conjuntas e a superação de dois desafios centrais: identificar a dinâmica de sua atuação e mensurar seu impacto na economia formal.
Este Anuário aborda esses desafios em quatro capítulos, estruturados para guiar o leitor desde a base conceitual até as recomendações estratégicas.
O Capítulo 1 apresenta os conceitos e referenciais teóricos utilizados para identificar e mensurar o fenômeno dos mercados ilícitos, como a teoria econômica do crime e o funcionamento das redes criminosas. Também introduz atualizações gerais sobre o tema, contextualizando as iniciativas de enfrentamento em andamento e os riscos emergentes, como o mau uso de novas tecnologias por operadores ilícitos.
O Capítulo 2 revela a dimensão econômica do problema por meio da Pesquisa de Monitoramento da Evolução dos Mercados Ilícitos, que estuda nove setores industriais. O capítulo detalha o impacto desse problema na indústria e na sociedade, traduzindo-o em perdas de postos de trabalho, renda e arrecadação tributária, e também analisa as externalidades negativas, como a violência, associadas a cada setor.
Os nove setores estudados são:
1. Alimentos e bebidas;
2. Automotivo;
3. Brinquedos;
4. Eletrônicos;
5. Higiene;
6. Medicamentos;
7. Químicos;
8. Tabaco;
9. Vestuário.

O Capítulo 3 aprofunda a análise do impacto direto no setor produtivo com os resultados da Pesquisa de Vitimização das Indústrias (PVI) no estado de São Paulo, incluindo a vitimização digital por meio da pesquisa sobre cibersegurança. A pesquisa também evidencia como a percepção de insegurança pode afetar a competitividade, desestimular investimentos e elevar os custos operacionais, além de aferir baixa confiança do setor no Sistema de Justiça Criminal.
Por fim, o Capítulo 4 explora os próximos desafios e propõe recomendações para o controle dos mercados ilícitos no estado de São Paulo, buscando prestar assistência à indústria por meio de material técnico para que ela possa pautar políticas públicas articuladas entre essas três áreas: segurança pública, controle sanitário e política fiscal. Adicionalmente, o capítulo detalha a aplicação de ferramentas proativas de inteligência corporativa, com destaque para a Inteligência de Fontes Abertas (OSINT), como método para monitorar e fiscalizar produtos ilícitos em ambientes digitais, visando encorajar uma maior cooperação no mercado.